Sobre Hidrelétricas e Desenvolvimento Sustentável

Estamos passando por uma fase complicada no Brasil, o PAC criou um frisson desenvolvimentista que há décadas não sentiamos. Porém, nos tempos de mudanças climáticas e reconhecimento social da importância de conhecermos os processos ecológicos que regem nosso ínfimo planetinha, desenvolvimento tomou outras proporções. Mais especificamente sobre a possível construção de hidrelétricas no norte brasileiro, na selva Amazônica, vemos como a concepção da palavra desenvolver tida pelas altas esferas governamentais distoa até dos conceitos econômicos mais capitalistas para "desenvolvimento", que dirá ambientais.

Até onde eu sei, desenvolvimento envolve o crescimento econômico associado a uma melhoria da qualidade de vida da sociedade, medida em todos os parâmetros econômicos e sociais existentes pra isso. Esse papo de ficar mostrando no jornal nacional o percentual de crescimento econômico e PIB, e usar o aumento deles para justificar a necessária ampliação da matriz energética, não cria uma relação direta com melhoria de vida da sociedade civil, quem acha isso tá caindo no conto do vigário.

Para não ficar no discurso amplo e incipiente, citarei um exemplo pouco conhecido e que está acontecendo agora. Um pouco acima de Belo Monte, no estado do Amapá, está rolando todo o processo para implantação de algumas hidreletricas. O estado do Amapá tem por essencia a utilização de matriz energética térmica (queima de diesel) o que realmente é um absurdo e precisa ser mudado. Nesse ponto de vista, acho fantástica a implantação de outra forma menos agressiva de se gerar energia. Porém, está prevista a construção de no mínimo 3 hidrelétricas, fora as PCHs (pequenas companhias hidrelétricas) para geração de energia. A que está em estado mais avançado é a de Ferreira Gomes, que já possui licença prévia, e que só ela, gerará mais energia do que o estado todo precisa para se manter, além do linhão do Tucuruí que vai chegar em 2012 (dizem as lendas que também é quando chegará internet banda larga, e outras lendas que vai ser o fim do mundo) e poderá gerar energia para o Amapá. Então eu pergunto, pra que tantas outras serem instaladas?

Fazendo uma análise rápida, o Amapá não tem grandes planos futuros de urbanização que vá duplicar ou triplicar a população, logo a demanda energética da população não vai aumentar tanto. Também não vai ampliar seu porto e desenvolver um polo comercial forte que poderia aumentar de várias formas a demanda energética do estado. O que eu tenho visto em discursos e nos bastidores, é o pleno interesse dos governantes em criar um pólo de indústrias voltadas à mineração, o que pra mim, é uma grande sacanagem com todo mundo que vem trabalhando com políticas ambientais no estado.

Só pra constar, o Amapá é um exemplo mundial de conservação da natureza, com 72% de sua área sob alguma forma de proteção (UCs ou áreas indígenas), demonstrando um potencial absurdo para o tão falado desenvolvimento sustentável. A construção de tanta hidrelétrica só mostra a incapacidade da gestão federal e estadual em reconhecer esse potencial e tentar explorá-lo. Não sou um eco-chato contra o desenvolvimento, não sigo o romantismo de achar que o modelo de vida ideal é de um ribeirinho, muito pelo contrário. Acho fundamental a estruturação do Amapá, estradas, cidades com sistema de saúde e ensino funcionando, geração de renda através de iniciativa privada, etc etc, mas acho que o Amapá tem que caminhar diferente do resto, porque essencialmente o Amapá é diferente.

Diversos estudos vêm sendo realizados em toda a Amazônia e em outras florestas tropicais sobre a utilização dos não tão famosos produtos florestais não madeireiros. Existem alguns conhecidos, como o famoso açaí, que já é um produto industrializado e faz parte da renda do estado, mas ainda é muito insignificante perto do todo. Fármacos, objetos de arte, utensílios em geral, que quando vistos como produtos com potencial de mercado exterior e tratados decentemente, dão muito dinheiro!! Vejam a Natura e suas campanhas sobre produtos naturais, nota preta!! Associações, cooperativas, ongs, e outras formas de união comunitária devem ser incentivadas para iniciar a geração de capital baseado numa forma mais coerente de utilização da floresta. O Amazonas iniciou o processo com a Zona Franca Verde e hoje tem apoio até do Bradesco, e isso rendeu alguns bons milhões para o estado e estruturou, para mim, um modelo de gestão exemplar para a Amazônia. O mundo quer essas iniciativas, quer ver o povo amazônida respeitando suas florestas.

Claro que precisamos sim de indústrias, geração de energia, e todos os itens imbutidos no processo de desenvolvimento, mas acho que também temos de levar mais a sério a palavra sustentável e discutir muito melhor qual e como vamos desenvolver o Amapá, a Amazonia e o mundo na situação que nos encontramos.

3 comentários:

ari_bebop disse...

amei os comentários! Realmente é muito impressionante tudo isso que você falou sobre o governo construir um grande pólo de industrias de mineração!! Não entendo como a iniciativa privada não se interessa em explorar as riquezas do Norte de forma saudável, como o exemplo que você citou da Natura...tá na cara que isso gera muito lucro. É uma pena isso.

Camila Karina disse...

Gostei gostei. E "nem te conto", eu trabalho na Promotoria de Defesa do Meio Ambiente...:)

Depois te passo nosso site.

Até mais.

FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR disse...

Olá Graciliano.
Só hoje tive tempo de ler o seu primeiro artigo no "Monólogo de um Biólogo".

Muito interessante.

Mandei um pequeno trecho para um dos principais assessores jurídicos do PV aqui em REcife, Prof. Cristiano Carrilho.

Vou indicar o seu blog p'ra ele.

Um abraço.

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